Desembargador Jorge Rachid concede liminar para o SINDJUS-MA

16/10/2015 | 16:37 - matéria visualizada 5814 vezes


MANDADO DE SEGURANÇA Nº 51.639/2015 – SÃO LUÍS
NÚMERO ÚNICO:      0009152-97.2015.8.10.0000
IMPETRANTE:            SINDICATO DOS SERVIDORES DA JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO – SINDJUS
Advogados:                 Drs. Alcebíades Tavares Dantas e outros
1ª IMPETRADA:          PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO
2º IMPETRADO:         ESTADO DO MARANHÃO
Relator:                       Des. JORGE RACHID MUBÁRACK MAL

DECISÃO


Cuida-se de Mandado de Segurança Preventivo, com pedido liminar, impetrado pelo Sindicato dos Servidores da Justiça do Estado do Maranhão – SINDIJUS, contra ato da Presidente deste Tribunal de Justiça e do Estado do Maranhão, objetivando a abstenção do corte de ponto e de descontos nos vencimentos dos servidores grevistas.

Aduziu o impetrante, em síntese, que, na qualidade de representante dos servidores e serventuários da Justiça do Estado do Maranhão, vem protocolando junto a esta Corte, desde janeiro de 2015, vários pedidos administrativos, solicitando a adoção de providências necessárias para o pagamento dos índices de reposição das perdas inflacionárias aos servidores ora representados, referente ao ano de 2014, no entanto, ainda não foi atendido pela primeira impetrada, ao argumento de insuficiência orçamentária.

Sustentou que a reposição de perdas inflacionárias é um pedido constitucional e amparado por lei, tanto que 22 (vinte e dois) dos Tribunais de Justiça do Brasil já pagaram a referida verba, o que revela que os servidores não pedem nada extraordinário ou fora dos estritos limites da lei.
Alegou que diante da omissão da primeira impetrada, não restou aos servidores outra alternativa senão o de usar o direito de greve, objetivando a necessidade da preservação da dignidade da pessoa humana dos servidores e das suas famílias, no entanto, estes se sentem ameaçados de sofrerem descontos em suas remunerações por parte da autoridade coatora, razão pela qual ajuizaram a presente ação.

Destacou a presença do fumus bonis iuris, consubstanciado em entendimentos de Tribunais pátrios, inclusive desta Corte, e do STF, uma vez que o corte de ponto dos servidores é ato abusivo e ilegal e compromete a sobrevivência familiar dos servidores reivindicadores, além do que consiste em uma coação financeira dos servidores em frustrar o exercício de um direito constitucional, tendo em vista que não pode ser exercido com prévia punição dos servidores, ou privando-os do exercício ou da liberdade e de seus bens, sem que haja o devido processo legal e seja permitido o direito de defesa.

Ressaltou, ainda, o periculum in mora, tendo em vista que a demora na concessão da liminar causa insegurança em toda a categoria, além do que se trata de verba de caráter alimentar e cortá-la significa suprimir o sustento do servidor e da sua família. Requereu, assim, a concessão da liminar, para que a autoridade coatora se abstenha de efetuar o corte de ponto e a proceder descontos nos vencimentos do servidores grevistas.

É o que interessa relatar.

A medida liminar em Mandado de Segurança tem por finalidade resguardar o pretenso direito alegado pela parte autora, até que haja o julgamento do mérito da ação, e deve ser deferida quando devidamente demonstrados os elementos necessários.

Trata-se de um provimento cautelar, admitido quando sejam relevantes os fundamentos da impetração, porém não importa em uma antecipação do julgamento, não afirma direito, visa apenas preservar a parte de uma lesão irreparável, sustando de forma provisória os efeitos do ato impugnado[1].

Para o deferimento de medida liminar em sede de Mandado de Segurança é necessária a demonstração dos requisitos exigidos em lei, quais sejam o fumus boni iuris e o periculum in mora.

No presente caso, o impetrante visa que a autoridade coatora se abstenha de efetuar o corte de ponto e dos descontos nos vencimentos do servidores do Poder Judiciário deste Estado, que se encontram em greve.

Delimitados os argumentos para a impetração, entendo que restam demonstrados os requisitos exigidos em lei para o deferimento do pedido liminar.

O direito de greve no serviço público encontra fundamento no art. 37, inciso VII, da Constituição Federal, que tem a seguinte redação:
“Art. 37 (…)

VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica.”
O legislador derivado incluiu no texto constitucional uma norma de eficácia contida, na medida em que reconheceu o direito de greve, porém, o seu exercício deverá ser realizado nos limites definidos em lei específica.
Diante da demora na edição da lei de greve no serviço público, o Supremo Tribunal Federal foi chamado a dirimir a lacuna legislativa e o fez através do Mandado de Injunção n.º 712, de relatoria do Ministro Eros Grau, julgado em 25/10/2007, nos seguintes termos:

MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS, CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano. 2.
A Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os servidores públicos civis exercer o direito de greve — artigo 37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo 9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis. 3. O preceito veiculado pelo artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a edição de ato normativo que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena incidência do preceito, atuação legislativa que dê concreção ao comando positivado no texto da Constituição. 4. Reconhecimento, por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do Congresso Nacional no que respeita ao dever, que lhe incumbe, de dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes. 5.Diante de mora legislativa, cumpre ao Supremo Tribunal Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta Corte não se presta, quando se trate da apreciação de mandados de injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia. 6. A greve, poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os trabalhadores visando à conquista de melhores condições de vida. Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito fundamental de caráter instrumental. 7. A Constituição, ao dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender. Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo constitucionalmente admissíveis todos os tipos de greve. 8. Na relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da exploração da atividade econômica pelos particulares. Neste, o exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os interesses egoísticos do sujeito detentor de capital — indivíduo ou empresa — que, em face dela, suporta, em tese, potencial ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre os interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas. Como a greve pode conduzir à diminuição de ganhos do titular de capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou potencialmente, algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual, em tese, aos interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente, interesses individuais, senão o interesse social. A greve no serviço público não compromete, diretamente, interesses egoísticos do detentor de capital, mas sim os interesses dos cidadãos que necessitam da prestação do serviço público. 9. A norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil reclama regulamentação, a fim de que seja adequadamente assegurada a coesão social. 10. A regulamentação do exercício do direito de greve pelos servidores públicos há de ser peculiar, mesmo porque “serviços ou atividades essenciais” e “necessidades inadiáveis da coletividade” não se superpõem a “serviços públicos”; e vice-versa. 11. Daí porque não deve ser aplicado ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A esta Corte impõe-se traçar os parâmetros atinentes a esse exercício. 12. O que deve ser regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o exercício do direito de greve pelo servidor público e as condições necessárias à coesão e interdependência social, que a prestação continuada dos serviços públicos assegura. 13. O argumento de que a Corte estaria então a legislar — o que se afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] — é insubsistente. 14. O Poder Judiciário está vinculado pelo dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece o ordenamento jurídico. 15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos. 16. Mandado de injunção julgado procedente, para remover o obstáculo decorrente da omissão legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil.

(MI 712, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384)
É certo que tal prerrogativa de índole fundamental comporta regulação com vistas a coibir eventuais abusos no seu exercício, de modo que, verificando a essencialidade dos serviços públicos em questão, devem ser estabelecidos limites à efetivação do movimento paredista, observadas as peculiaridades de cada caso concreto, não podendo o interesse da classe profissional se sobrepor ao interesse da coletividade.
O Pretório Excelso ao apreciar simultaneamente os Mandados de Injunção nºs 670/ES, 708/DF e 712/PA, decidiu que, como regra geral, “os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho (art. 7º da Lei no 7.783/1989, in fine)”.
Nesse aspecto, numa análise sumária da questão, verifico a impossibilidade do corte de ponto dos servidores em greve e do desconto nos vencimentos dos servidores grevistas, além do que nada mais é do que imposição do retorno dos mesmos ao trabalho, de modo que inviabiliza o direito de greve, caracterizando, assim, o fumus boni iuris a favor do impetrante. Ressalte-se que ainda não foi proferida qualquer decisão judicial a respeito da legalidade ou não da greve.
Por outro lado, o periculum in mora também restou evidenciado, tendo em vista que se trata de verba de caráter alimentar e o seu corte, sem dúvida, acarretará prejuízo aos servidores juntamente com suas famílias, que ficaram privados de parte dos seus salários, que é necessário a sua subsistência.
Assim, sem prejuízo de ulterior deliberação, quando do julgamento do mérito, defiro o pedido liminar, para determinar que a autoridade coatora se abstenha de proceder ao corte de ponto, bem como de efetuar descontos nos vencimentos dos servidores grevistas, enquanto perdurar o movimento.
Outrossim, determino sejam intimadas as autoridades impetradas para, em 10 (dez) dias, prestarem as informações pertinentes, encaminhando-lhes cópia da inicial e demais documentos que a instruem.
Proceda-se, ainda, à citação do Procurador Geral do Estado, nos termos do art. 7º, inc. II, da Lei nº 12.016/2009[2].
Publique-se e cumpra-se.

São Luís, 16 de outubro de 2015.
Des. JORGE RACHID MUBÁRACK MALUF
Relator

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